quarta-feira, 29 de julho de 2009

as rugas no nariz,
a lembrança do cheiro,
as únicas três palavras de que me lembro...
... bom dia, Nicodemo!
Não pode ser tão ruim. Não é tão ruim não acordar.
Se eu ainda fosse a antiga, ela lhe diria desesperadamente para dar a volta e entrar pela mesma porta, a qual ela passara vestígios de vida. Vida. É o que ela ainda achava que tinha.
Se eu, se ela, ou nós duas abríssemos a porta, o sapato ocre poderia impregnar na memória e dessa vez poderia ser do lado errado. Se o par destinto deixasse a imagem subir a gravata, talvez o nó jamais descesse pela nossa garganta.
Não engoli seco. Eu engoli o seco.
Mais três passos e suas ruguinhas do sorriso me assombrariam para sempre.
Se ele erguesse a mão direita para acenar, talvez o cheiro me sufocasse e eu já pudesse assinar o tratado da ignorância e aceitar as consequências que isso me trouxe.
E se, a última gota de misericórdia do mundo para comigo esvairisse e ele abrisse a boca para dizer as três que de tão malditas são benditas palavras, eu me paralisaria alí e não ouviria mais o som de nada, a não ser do sussurro da voz perdida na lembrança bem em minha frente.
Não pode ser tão ruim. Não é tão ruim acordar.
Não pode ser tão ruim, somente o fim, não acordar.
as rugas no nariz,
a lembrança do cheiro,
as únicas três palavras de que me lembro...
... boa noite, Nicodemo!

Por eles, e por mim

Caracterizar fatos constantemente ativos em mim tem sido um pouco mais complicado e confuso.
Arriscar uma qualificação dos mesmos talvez não seja o melhor meio de me "salvar" dos mesmos. Inclusive, eu sei que isso não me salvaria.
De qualquer maneira, por eles mesmos eu tento os mudar. Se antes eu procurava fazer, agora eu procuro pensar. E pensar também para onde estou levando minha bagagem.
Poe eles mesmos eu tento os mudar. Mudá-los de direção, ou pelo menos achar uma.
Manter o foco não se é preciso quando não se tem um foco. É desnecessário e chega a ser medíocre.
Por eles mesmos, e por mim, os cintos estão mais apertados agora. O som me guia, e eu já não tenho mais tanto medo para onde ele me levará. Eu não confio nele, mas tento traduzi-lo e isso me faz entender e guiar a mim mesma.
Por eles, e por mim. Por nada mais. Eu posso acertar o alvo na parede do meu quarto, do barzinho onde toca música e todos jogam, do muro na rua, no muro do quarto com música do mundo.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Tuas asas eram farsas

Acreditar em algo que você simplesmente não aceita é ainda mais difícil. Mas, mais do que isso, é realmente inacreditável que tuas asas tenham se cortado, ou na verdade, que elas não tenham existido jamais.
Mais difícil ainda é lembrar da angústia de te querer o bem e te cuidar, ainda que longe, porque eu confiava fielmente que tuas asas pairavam sobre mim.
Cruel! Nada mais cruel do que arrancar as asas fracas na minha frente e gritar a razão, também falsa. Nada mais cruel do que me mostrar que tu não sabias voar, e que então não poderá me ensinar.
Nem lágrimas falsas, nem pedidos emocionalmente culpados poderão amenizar ou aliviar o que por dentro queima não só de tristeza, mas de fúria, porque quando se pula de um penhasco apostando com total certeza de que nada te fará cair - uma vez que se tem um anjo - e descobres no fim, sentindo a dor das feridas que o suposto deveras não existia, tua sentença se torna irrevogável.
Cruel. Mas tua força falsa também não é a bastante para me fazer refém da angústia eternamente, nem se quer por muito tempo, pois partindo do presuposto de que quem aceita o amor e não o nega no fim tem toda sua resistência que, por mais que pareça inútil e doentia no começo, por mais que pareça o vilão e hostil, está dentro de ti, tu jamais cairás em real obscuridade. Obscuridade essa em que você preferiu se afundar, e que conhecerá ainda melhor no futuro que escolhestes.
Nada será o bastante para se quer aliviar. E tua falta de fé te faz ainda mais fraco, e causa a falta de tua fé em si mesmo. Jamais alcançarás o céu, a glória, se quer na terra de meus pés. Tua "não fé" bastarda te corrompe ainda mais, e te faz ser quem troca amor por doença e sofrimento de uma fraqueza sem fim. Te faz ser o oposto do que eu estava disposta a ter para sempre, nem que menos do que tu fingias querer.
Mas que tu, de falsas, fracas e tão ingênuas asas saibas que sei quanto sou depois de cair e o quanto tuas "asas" não mereciam carregar tamanha imensidão.